O caos no clima se espalhou pelo mundo em setembro. Não só o Brasil, mas quase toda a América do Sul sofre com seca, calor e incêndios extremos. Portugal, do outro lado do Atlântico, também é castigado pelo fogo. A China e parte da Ásia enfrentam um tufão por semana. Enquanto isso, partes de EUA e Europa estão sob chuvas torrenciais. Na África, o Deserto do Saara teve inundações, e o Sudão do Sul poderá sofrer o primeiro deslocamento em massa permanente do mundo em função de mudanças climáticas.
Numerosos fatores meteorológicos são associados a esses extremos. O denominador comum é o aquecimento da atmosfera e dos oceanos, um padrão associado às mudanças climáticas, afirma o climatologista José Marengo, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). O atual período é considerado neutro. Não tem nem El Niño, associado ao aquecimento das águas do Pacífico, nem La Niña, deflagrada pelo esfriamento. Ambos os fenômenos causam extremos climáticos. O El Niño acabou em junho. E a muito antecipada La Niña está cada vez mais distante. Deveria começar em julho e agora, na melhor das hipóteses, tem cerca de 70% de chance de iniciar no fim de novembro ou dezembro, segundo a Agência de Oceanos e Atmosfera dos EUA (Noaa, na sigla em inglês).
Marengo diz que não se sabe o porquê de a natureza ter mudado de ideia e La Niña estar definhando antes mesmo de nascer. Tudo indica que ela será tardia, fraca e breve.
Já o aquecimento do Oceano Atlântico é o maior registrado. Há 16 meses consecutivos ele está acima da média histórica, de acordo com o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), a agência europeia do clima. O maior aquecimento acontece no Atlântico Tropical Norte, leva chuvas torrenciais para a América Central e deixa a do Sul seca. A seguir, os extremos em curso no mundo.
Todo o continente, à exceção do sul da Argentina e do Chile, tem registrado chuvas abaixo da média nos últimos três meses. Sendo que nas regiões centrais, que abarcam parte da Amazônia, do Centro-Oeste, do Sudeste e todo o Pantanal brasileiros; grande parte do território de Bolívia e Paraguai, há 24 meses a chuva está muito abaixo da média, num padrão de seca. A América do Sul está secando, afirma a especialista em hidrologia do Cemaden Adriana Cuartas. A seca tem se manifestado em baixa da vazão das cabeceiras onde nascem alguns dos mais importantes rios do continente, como o Amazonas (no Peru) e Madeira (na Bolívia). O calor extremo tem sido regra e incêndios florestais afetam, além do Brasil, Bolívia (que declarou emergência nacional), Argentina, Paraguai, Peru, Colômbia e Venezuela. No caso da América do Sul, anomalias associadas ao aquecimento do Atlântico têm sido preponderantes.
O continente europeu está sob dois extremos. Portugal enfrenta um dos piores incêndios florestais de sua História e os mais severos desde 2001. Cinco mil bombeiros combatem as chamas que afetam principalmente o norte e o centro do país e desde domingo mataram sete pessoas e feriram outras 50. Já a Europa Central sofre com chuvas torrenciais que deixam cidades debaixo d’água em Áustria, Romênia, República Tcheca e Polônia, onde os 44 mil moradores da cidade de Nysa tiveram que ser retirados. A climatologista Sonia Seneviratne, do ETH Zurich, disse que as tempestades estão associadas à grande quantidade de vapor d’água lançada pelo Mediterrâneo e o Mar Negro, também mais quentes que a média.
A inundação no Sudão do Sul começou em maio e se intensificou este mês. Cerca de 700 mil pessoas foram afetadas e se teme que não possam mais voltar para casa no Suud, porque a região se tornará um lodaçal inabitável por longo tempo ou até permanentemente. O tipo de terreno faz com que algumas áreas possam ficar permanentemente sob a água, há também risco de doenças como malária. O país pode ter o primeiro deslocamento em massa permanente causado por extremos climáticos. As inundações também afetaram o Deserto do Saara. Áreas de Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Nigéria sofreram alagamentos. A chuva torrencial foi causada por um ciclone extratropical anômalo, que atingiu o deserto nos dias 7 e 8 deste mês. A Nasa destacou que chuvas no deserto podem ocorrer, mas essas foram excepcionais.
O tufão Bebinca parou Xangai, o coração financeiro da China. Meteorologistas chineses disseram ao jornal South China Morning Post que outro tufão está em formação e que até outubro o país será atingido por um tufão por semana até outubro. Já Mianmar e Vietnã foram devastados este mês pelo tufão Yagi. Mais de 200 pessoas morreram em cada um dos dois países, plantações foram perdidas e cidades, alagadas. O Yagi é até agora o tufão mais forte do ano na Ásia.
A Carolina do Norte foi atingida na segunda-feira por uma tempestade que despejou 460 mm de água em 12 horas. Para os padrões climáticos da região é um evento que se considera ocorrer uma vez a cada 1.000 anos, informou o Serviço Nacional de Meteorologia dos EUA. Já o furacão de categoria 2 Francine castigou esta semana a Louisiana. Enquanto isso, Califórnia, Nevada, Idaho e Oregon combatem incêndios florestais.
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Fonte: O Globo